Por Matheus Taranto
O perturbador, o macabro, o sinistro. Somos paradoxalmente afastados e atraídos por coisas que podem nos trazer mal-estar, o que é perturbador, mas fascinante. Escândalos de celebridades, drama, desfiguração, crimes reais, guerra e sanguinolência são alguns exemplos. Mesmo que sejam acontecimentos negativos para alguém, não conseguimos deixar de olhar e nos interessar, mas por quê?
Bom, não há um único motivo, há muitos deles. Nós gostamos de coisas perturbadoras porque elas nos dão força, realidade e significado. Pode ser estranho que gostemos disso, mas é parte do que nos mantém vivos. Somos curiosos, mesmo que o resultado possa ser ruim. Há uma base neurológica para explorar o perigo e nós nos tornamos mais atentos e alertas quando amedrontados.
As reações na mente
Neurotransmissores como norepinefrina e dopamina são liberados quando estamos assustados fisicamente e mentalmente, preparando-nos para enfrentar uma ameaça ou escaparmos dela. Dopamina faz parte do sistema de recompensa do cérebro, é liberada em resposta a coisas prazerosas, como conquistas ou comer algo bom, mas não significa que nossos cérebros achem que coisas perturbadoras sejam prazerosas.
Quando sistemas de dopamina são inibidos em animais de laboratório, eles irão parar de procurar comida e literalmente morrer de fome. É porque não acham mais a comida prazerosa? Não. Se a comida for posta em suas bocas, eles irão consumi-la com sinais de satisfação. Evidências como esta sugerem que o cérebro contenha sistemas que motivem a procura, a aproximação e a curiosidade pelo seu próprio bem e isto tem implicações no estudo de comportamentos compulsivos.
O psicólogo Eric Wilson, escritor do livro “Todos adoram um bom desastre de trem”, diz que a nossa atração pelo macabro é em algum nível um desejo de experimentar o sofrimento alheio. Geralmente é sobre a imaginação: imaginar como seria ser aquela pessoa, e esses sentimentos empáticos nos lembrma que nosso tempo é limitado, somos frágeis, aumentando a nossa união como espécie.
Ao acompanhar escândalos de celebridades ou ver a derrota nos rostos do time adversário, podemos nos sentir muito bem. Isto é chamado Schadenfreude, termo alemão que significa “alegria na injúria”. Apesar de notas e posições causarem ansiedade, nós ainda assim possuímos um desejo de procurar avaliações sobre nós mesmos em comparação com os outros, e gostamos especialmente das avaliações que nos colocam no topo.
“Eu deveria mesmo sentir isso?”
Um estudo conduzido pelo Instituto Nacional de Saúde e Bem-Estar da Finlândia descobriu que crianças eram quatro vezes mais propensas a serem assustadas pelos seus programas televisivos quando um de seus pais estava na sala. Isso surpreendeu os pesquisadores, mas a explicação está na ideia de que para uma criança pequena, quase tudo é completamente novo. Logo, ao observar seus pais, que são mais velhos e sábios, assustados com algo na televisão, os filhos criam a memória de que aquilo é perigoso e deve ser temido.
Assistir a coisas desagradáveis não as torna menos desagradáveis. Curiosidade mórbida é também sobre aceitação. Nossos cérebros estão configurados com motivos para explorar coisas desagradáveis, pois fazê-lo é preferível à ignorância. Espantar-se com a morbidez geralmente é sobre perguntar-se: “por quê?”, busca-se uma razão, um sentido atrás disso tudo. Katelin Dodi, a apresentadora do “Pergunte ao Agente Funerário” no YouTube, resume esse sentimento. “Aceitar a morte não significa que você não ficará devastado quando alguém que você ama morre, significa que você poderá focar no seu pesar, aliviado das grandes questões existenciais. A morte não acontece só com você, a morte está acontecendo com todos nós.”.
Exploração das sensações na mídia
Um formato de programa muito popular, principalmente no Brasil, são os jornais que apelam para as sensações, como Cidade Alerta ou Brasil Urgente, que se utilizam de imagens chocantes, depoimentos de pessoas em situação de vulnerabilidade, cobertura de perseguições ao vivo, dentre muitos outros aspectos para prender o telespectador e aumentar sua audiência, coisas que são consideradas antiéticas pelo jornalismo. E o seu sucesso se deve, principalmente, à curiosidade mórbida.
A jornalista Francislene Pereira de Paula, que estuda o assunto, diz que as sensações costumam ser usadas para atrair leitores apelando para seu lado negativo. Ao detalhar os eventos, dando ênfase no absurdo, os jornalistas podem explorar a curiosidade mórbida das pessoas e levá-las a ler suas histórias. Ela também afirma que ao mesmo tempo que essa é uma ferramenta poderosa para os jornalistas, ela também pode ser usada de forma irresponsável, reforçando estereótipos negativos e contribuindo para a disseminação de desinformação.
Para muitos espectadores, tópicos como política e economia, comumente abordados em jornais tradicionais, podem parecer complexos. Já os programas que exploram as sensações se aproximam de temas cotidianos, como a realidade de violência das grandes cidades. Através de uma narrativa que mescla elementos do jornalismo com a linguagem melodramátrica, eles levam o telespectador a acompanhar as histórias como se as vítimas fossem pessoas conhecidas, do mesmo ciclo, aumentando ainda mais os ativadores de curiosidade em nossa mente.