Por Lara Alves Batista
Era silêncio. De repente, o som. Muito alto, ensurdecedor. Acorda Maria Laudelina, acorda! Pobre trabalhador não pode descansar. A mulher levantou o braço tateando a cabeceira velha em busca do relógio. Não eram nem 4 da manhã, mas, como sempre, era hora de levantar. Dessa vez, resolveu ficar na cama mais um pouco. Pensou na vida e em quem era. Depois, riu de si mesma por pensar. Não podia nem pensar, ocupava tempo. Pensar é coisa de madame.
Correu para fora da cama e foi fazer tudo de novo. Café, criança, marido, creche, ônibus e trabalho. De repente, já eram nove. Estava atrasada, mas respirou fundo e tocou a campainha do apartamento chique na zona sul.
— Você está atrasada. – vociferou a patroa.
— Desculpa, senhora. É que meu filho estava doente e…
Foi interrompida
— Poxa, melhoras para ele. Entra!
A moça entrou, receosa e encolhida. Trabalhou rápido, com pressa. Queria voltar para ver o filho. Resolveu pedir à patroa para ir embora mais cedo.
— Ah, Mariazinha, você bem sabe que é parte da família, mas não posso deixar você ir embora mais cedo. Não deu seu horário. Quem vai vigiar o Bruninho quando eu for para o salão?- disse a patroa.
— Tudo bem…- gemeu Maria.
No caminho de casa pensou na conversa com a patroa. Mariazinha, Mariazinha, Mariazinha… Seu nome não era Maria. Era Maria Laudelina, batizada por sua falecida mãe, empregada doméstica também. Sua mãe dizia que era nome de guerreira, de mulher forte. Era o nome de mulher que resistia antes de pensar em resistir.
Naquela noite, cuidou do filho. Chorou como Maria a dor de seu menino. Sem conseguir dormir, pegou o celular e pesquisou a origem do nome Maria Laudelina. Encontrou Laudelina de Campos, neta de escravizados, liderança política que teve trajetória marcada pela luta do povo negro e das empregadas domésticas. Ela fundou a Associação das Empregadas Domésticas, primeira entidade voltada à defesa e representação dos trabalhadores domésticos no Brasil.
Sentiu uma lágrima solitária cair na bochecha. Olhou para o filho doente e resolveu que iria achar uma Laudelina na sua Maria. Era silêncio. De repente, o som.