Por João Gabriel Rothier

Numa quarta feira qualquer de carnaval, eu fui num bloco, ali na Lapa, do lado do morro de Seu Zé. Passei no ambulante, pedi um latão e fui subindo a rua de mãos dadas com minha namorada, pensando que o chão que pisamos foi frequentado por meus heróis e serviu de inspiração para suas composições que me embalam até hoje. 

Por mais de 200 anos o Rio de Janeiro foi o berço, a casa e exportador do samba, do pagode, da vadiagem e da malandragem. Mas lá no começo de tudo isso, na pequena África, uma senhora baiana servia seu casarão para os patronos do ritmo fazerem suas festas.

Tia Ciata era ialorixá, filha de Oxum, quituteira, mãe, sambista e tida por muitos como a pessoa mais importante do cenário musical fluminense da época. Foi em sua casa que a gravação do primeiro samba ocorreu. Foram suas vestes de baiana rodada que vestiram inúmeros carnavais cariocas. Foram seus filhos e netos que propagaram a cultura do ritmo que veio do jongo e do batuque africano.

Subindo as ruas da parte boêmia da cidade é possível ver seus reflexos na vida do carioca até hoje. Sua casa é ponto de encontro de turistas e admiradores locais. Sua imagem aparece em escolas de samba e barracões sendo cultuada como uma entidade.

Hoje eu, aos 19 anos, vivo seu legado, propago seus ideais, cultuo sua fé e respeito sua memória. Me espelho na sua luta por respeito como pessoa negra. Mas principalmente a enxergo. Em ruas, praças, sambas, rodas e festas e corações.

Pra mim, Hilária Batista de Almeida não morreu, e se depender de mim não morrerá. Tia Ciata é eterna. O samba vive, o Candomblé resiste e novas Ciatas lutam por isso. Eu luto por isso.

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