Por Yasmin Ramalho

Se um dia o entretenimento e o acesso à informação através dos meios de comunicação estavam associados, principalmente, aos programas de televisão, hoje as redes sociais assumiram um lugar de destaque na oferta de conteúdos ligados à cultura. TikTok, Instagram e YouTube se tornaram ponto de encontro para um público consumidor de música e outras formas de expressão artística, criando novas oportunidades de negócio online.  

A publicitária Laíse Neves trabalha com redes sociais e conta que muitas marcas utilizam o marketing de conteúdo através da música, o que acaba sendo mais atrativo e gerando engajamento.

“O público embarca na brincadeira e isso acaba estreitando mais o relacionamento com a marca. Música é união em todos os sentidos”, considerou.

Para ela, quem estabelece o limite entre a criação de conteúdo como entretenimento ou além é a pessoa que vai produzir este material.

“Você pode começar a criar conteúdos musicais (assim como outros assuntos) por hobby, naturalmente conquistar um público e torná-lo fiel a ponto de marcas estarem interessadas e oferecerem publis ou até mesmo participações em ativações e demais projetos, mas no final das contas você decide se é esse o caminho que quer seguir ou não”, analisou.

A hora das grandes marcas

Grandes nomes da música também usam as redes como forma de divulgação do seu trabalho e ampliação dos lucros. Um exemplo conhecido deste sucesso é a cantora Taylor Swift, que movimenta números exorbitantes nas redes sociais e fora delas. Em sua passagem pelo Brasil através de seis shows da turnê “The Eras Tour”, a expectativa era de que a norte-americana movimentasse cerca de R$ 400 milhões no mercado de turismo no país. Além disso, gera engajamentos astronômicos, como através da hashtag “SwiftTok”, no TikTok, na qual conta com mais de 44 bilhões de visualizações.

Sua forte presença nas plataformas digitais também acaba por conectar sua comunidade de fãs, que diante da morte da fã Ana Clara Benevides, no show realizado no Rio de Janeiro no dia 17 de novembro, conseguiu arrecadar o valor necessário para transportar o corpo da brasileira de volta à sua cidade-natal no Mato Grosso do Sul.

Produtores de conteúdo musical independentes

No entanto, a produção de conteúdo não se resume apenas às vendas de grandes marcas e artistas. É, ainda, uma forma de compartilhar informação, contar histórias e estabelecer conexões com diferentes públicos.

O canal Na Banguela foi criado no final de 2020 por Daniel Lodovico e Renato Bertoni como uma forma de expressão em meio ao auge da pandemia de covid-19.

“A ideia inicial era fazer um podcast sobre música, cultura e política, mas não sabíamos aonde chegaria, por isso a expressão ‘na banguela’, que aqui em São Paulo representa aquele momento em que você tá em uma ladeira, desliga o motor do carro e ele desce sozinho, para economizar a bateria”, contou Daniel.

Legenda: Daniel e Renato, do canal Na Banguela | Foto: Acervo pessoal

A partir de então a dupla começou a fazer vídeos com muito conteúdo musical, dando sugestões de artistas, álbuns, contando histórias sobre gêneros musicais como o samba e o Hip-Hop e outras vertentes da indústria.

“Através da música eu acesso sentimentos que não consigo acessar de nenhuma outra forma. É um meio de expressão incrível e tem o papel de consciência política, social, da educação. E é isso que eu e o Renato tentamos transmitir no Na Banguela, nossas impressões sobre o que consumimos de cultura, como vemos o mundo e tentamos transformar isso em conteúdo”, disse o estudante de História.

Os temas abordados nos vídeos surgem da troca de ideias entre os idealizadores. Um álbum novo, uma pesquisa musical interessante ou uma demanda política urgente podem ser um prato cheio para o canal e seus mais de oito mil seguidores no Instagram.

“Às vezes a gente pode fazer um vídeo com indicação de um álbum, de um artista porque achamos essa pessoa musicalmente boa e isso é puro entretenimento. Nós também tentamos colocar uma pitada de humor nos vídeos por acharmos que é uma forma forte de entreter e prender as pessoas em um primeiro momento”, acrescentou Daniel.

O canal não monetiza através de suas contas nas redes sociais, mas seus fundadores apostaram em um modelo de recompensas para valorizar a produção de seus conteúdos. Através de uma contribuição a partir de R$ 5, apoiadores são recompensados mensalmente com uma playlist de curadoria musical exclusiva, uma ação que ainda não paga os custos de produção, mas que já mobiliza um público fiel.

Legenda: Comemoração dos 50 anos da cultura Hip-Hop no Vale do Anhangabaú, São Paulo, em 23 de agosto de 2023 | Foto por: @rodilei

O amor pela música também está por trás do Kalamidade, que foi fundado em 2020 pelos DJs Carol Yume e Pepeu. A ideia de organizar uma festa de valorização da cultura Hip-Hop logo se expandiu para um coletivo com cerca de 20 pessoas, dando vida a um site e uma plataforma de conteúdo.

“O papel do Kalamidade é conectar pessoas através do som, no começo era sobre reunir amantes da cultura Hip-Hop para trocar ideias e sobreviver à pandemia através da arte. Com o tempo isso foi se expandindo e nossa responsabilidade sobre a cultura aumentou. O papel passou a ser também falar sobre a cultura “para além do mic na mão”, ou seja, sobre beatmakers, DJs, produtores e todo o ecossistema para além do MC”, contou Yume.

A plataforma acabou se estendendo pelo mundo virtual, onde possui um site recheado de matérias sobre a história do Hip-Hop, podcasts sobre a indústria musical, além de vídeos no Instagram e um documentário.

A produção “A Arte política de Festejar”, lançada no Youtube em abril de 2023, foi resultado de um projeto aprovado através do Edital de Retomada Cultural promovido pela Secretaria Municipal de Cultura do Estado de São Paulo. Entre junho e novembro de 2021, o coletivo percorreu as cinco regiões do estado de São Paulo para promover eventos em casas de cultura. 

“A partir do ‘festejar’, nosso coletivo viu uma forma de ampliar o debate em torno da festa como ato político e de fortalecer a celebração da cultura Hip-Hop para as periferias de São Paulo. E o documentário é resultado disso, um retrato das nossas cinco festas pelos quatro cantos e centro de São Paulo, com DJs do coletivo e convidados de várias áreas do estado”, acrescentou a analista de marketing.

Do outro lado da tela

Caio Miniguelle é um consumidor ávido de conteúdo musical nas redes sociais. O carioca tem o costume de enviar músicas e playlists para seus amigos próximos e já chegou a cogitar criar uma espécie de curadoria musical aberta a seus seguidores.

Descrevendo sua relação com a música como “vital”, este entusiasta das artes conta que busca relacionar as sonoridades ao seu cotidiano, aprendendo a lidar com as situações apresentadas pela vida.

“Na maioria das vezes as letras têm muito a nos ensinar e viram movimentos políticos, tendo sua linha de ideologia muito baseada e influenciada por bandas, rappers e MCs que te fazem pensar e sair da caixinha. Fazem você questionar a realidade, te colocam no lugar de outra pessoa, às vezes até mesmo da própria cidade, mas de realidades diferentes”, analisou.

Com o costume de ir a festivais e shows de artistas que não conhece, Caio gosta de consumir conteúdos sobre Rap, Hip-Hop e criadores independentes que fazem avaliações de álbuns recentemente lançados. Perfis no Instagram como rapmais, AUR e Tenho Mais Discos Que Amigos são alguns de seus preferidos para se informar sobre as notícias do universo musical.

Além de publicitária, Laíse Neves também é amante da dança e da música desde pequena por influência do pai, que sempre colocava CDs para tocar em casa. “Costumo dizer que 70% dos ritmos e gêneros musicais que gosto são por influência dele. Hoje, sou eu quem apresenta alguns artistas pra ele”, relatou.

Entre seus criadores de conteúdo independentes preferidos estão as páginas no Instagram Groove, Amores Sonoros e Brasa Mag, que acabam servindo de inspiração, uma vez que o  amor por estas formas de expressão a motivou a criar conteúdos musicais em suas redes sociais.

“Já criei conteúdo, mas na época, decidi pausar para cuidar do meu mental e não tornar uma paixão algo obrigatório. Mas estou com planos de voltar. O intuito é compartilhar minhas descobertas musicais com meus amigos e contar um pouco das histórias das músicas que ouço com base em estados de espírito”, afirmou.

Além disso, a comunicadora planeja voltar com outros projetos que envolvem não só a música, mas outras artes também e deixa um recado: “E, ó, tem playlists prontas para serem compartilhadas, viu?!”, fazendo menção às suas seleções musicais.

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