Por Israel Silva

No ano de 2022 entrou em vigor a Política Nacional Aldir Blanc, Lei N° 14.399. O projeto de lei determina que o Governo Federal destine R$ 3 bilhões anualmente durante o período de 2023 a 2027. A Política Nacional Aldir Blanc propicia ao Plano Nacional de Cultura Viva recursos financeiros para investimentos de projetos em áreas periféricas, por meio dos pontos de cultura, proporcionando aos moradores das localidades momentos de conhecimento, pertencimento e inclusão. Vale ressaltar que durante a gestão do ex-presidente Jair Bolsonaro o governo federal proporcionou 63% a menos de verbas financeiras em comparação a anos anteriores no setor cultural. 

A política de cultura viva foi criada com o objetivo de democratizar o acesso de pessoas mais humildes à cultura. “O Cultura Viva tem facilidade em entrar em todos os ambientes porque nós [pontos culturais] atingimos, e temos que atingir mais os menos favorecidos. Essa capilaridade é possível sim porque eu vejo nessas reuniões muitos meninos, muitas meninas querendo saber como aquilo [pontos de cultura] funciona e a gente tem que facilitar [o acesso].” Fala de Antônio Machado, presidente do Ponto de Cultura Sociedade Fluminense de Fotografia (SFF). 

Trajetória das leis culturais em âmbito nacional

Criada no intuito de estimular a cultura, a Lei Cultura Viva foi implementada no ano de 2004 durante o primeiro mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Em julho de 2014, sancionada pela presidenta Dilma Rousseff, a Lei Cultura Viva passa a ser um projeto nacional que tem o intuito de  valorizar a diversidade cultural brasileira, simplificar e desburocratizar os processos de prestação de contas e o repasse de recursos para as organizações da sociedade civil. Segundo dados divulgados na Cartinha sobre a explicação da Política Nacional de Cultura Viva, Lei Nº 13.018 disponibilizada pelo governo federal em janeiro de 2023, entre 2004 e 2021 foram investidos no ramo cultural cerca de R$ 441 milhões. Vale frisar que esses números são referentes a um período antes da criação da Política Nacional Aldir Blanc e da Lei Paulo Gustavo.

A Política Nacional Aldir Blanc de Fomento à Cultura (PNAB), Lei Nº 14.399, possui o caráter de ser uma política nacional permanente e descentralizadora, vai injetar até o ano de 2027 R$ 15 bilhões em estados, municípios e na federação. O uso da verba é voltado para à promoção do desenvolvimento humano, social e econômico, tendo como princípios o respeito à diversidade, à democratização e à universalização do acesso à cultura. A PNAB foi nomeada em homenagem ao escritor e compositor Aldir Blanc, que morreu em maio de 2020, vítima da Covid-19. Aldir foi um dos mais importantes compositores da música popular brasileira e sua obra é considerada patrimônio cultural do país.

A PNAB prevê recursos para chamamentos públicos, prêmios, aquisição de bens e serviços vinculados ao setor, destinado às seguintes áreas: produções audiovisuais, manifestações culturais, desenvolvimento de atividades de economia criativa e solidária, realização de ações; projetos; programas e atividades artísticas e ações visadas para o patrimônio cultural e de memória e a manutenção; formação; desenvolvimento técnico e estruturais de agentes; espaços; intervenções; oficinas; cursos; performances e produções. 

Já a Lei Paulo Gustavo, Lei complementar Nº 195/2022, disponibilizou uma verba geral de aproximadamente R$ 3,8 bilhões  para a execução de ações e projetos em todo o território nacional. Assim como a PNAB, a Lei  Paulo Gustavo ofertará o acesso aos valores por intermédio de editais, chamamentos públicos, prêmios, aquisição de bens e serviços ou outras formas de seleção pública simplificada executados pelos estados, municípios e federação. Paulo Gustavo foi um relevante artista que faleceu em maio de 2021 que, assim como Aldir Blanc, foi mais uma vítima da COVID-19.

Acesso da política pública nas comunidades

Marcos Vinícius. 14 anos. Estudante do ensino fundamental e professor de tamborim no projeto social Rítmo & Samba oferecido pelo Ponto de Cultura Acadêmicos do Data Vênia. No ano passado, quando tinha 13 anos, Marcos foi aluno de tamborim do mesmo projeto, oferecido pela Data Vênia há seis anos. Para esse ano, a diretoria da escola de samba o convidou para ministrar aulas de tamborim. Marcos Vinícius, relata a sua trajetória na instituição: “eu tenho um ano e seis meses que eu estou aqui, e ano passado comecei sendo um aluno e esse ano me chamaram para ser o professor de tamborim aqui no projeto da Data Vênia. E amei ensinar tamborim para todo mundo que está interessado [em aprender] e é uma grande paixão mesmo.”

Em 2024, o Brasil atingiu a marca de cinco mil Pontos de Cultura cadastrados oficialmente. Já na cidade de Niterói são doze ações – dentre Pontos e Pontões de Cultura – registrados pela prefeitura do município. O exemplo do adolescente Marcos Vinícius demonstra que a Política Nacional de Cultura Viva tem a facilidade de atingir públicos que historicamente são considerados minoritários. “A cultura ela traz inclusão, ela proporciona e atinge sempre grupos que são excluídos na maioria das vezes e principalmente essas atividades culturais que são de resistência sempre tem ao longo da história. Você vai acompanhando e são lutas e causas, fazeres que nasceram de uma determinada época, através de alguma resistência com a própria população da época em si”. Conta Karoll Maia Professora de Capoeira do projeto Din Down Down – Construindo Laços com a Família e gerente do Ponto de Cultura niteroiense Instituto GINGAS.

Pontos de cultura da cidade de Niterói e sua breve trajetória

Na cidade de Niterói ao todo são doze pontos de cultura, sendo dois deles Pontões de Cultura e os demais considerados Pontos de Cultura. As instituições que desenvolvem a função de Pontão são responsáveis por articular os Pontos de Cultura e ações culturais locais em conjunto com a rede municipal. Já os Pontos de Cultura são empresas não governamentais apoiadas financeiramente e reconhecidas institucionalmente pelo Ministério da Cultura para desenvolverem projetos socioculturais em suas localidades.

Alunos do projeto Din Down Down em aula na sede da APAE/Niterói. Foto: Israel Silva

BemTv (@bem.tv):

Fundada em 1992, a BemTv trabalha com mídia e educação voltada à adolescentes e jovens periféricos da cidade de Niterói e São Gonçalo. Se tornou Ponto de Cultura no ano de 2017 e, dois anos depois, foi reconhecido como Pontão de Cultura. Os projetos socioculturais mais destacados da ONG são o Olho Vivo que consiste em aulas teóricas e práticas de fotografia e a Agência Popular Jovens Comunicadores que é uma formação em comunicação popular. A direção e a coordenação da instituição é formada predominantemente por mulheres e o Projeto Olho Vivo ganhou dois prêmios Itaú Unicef (2007 e 2017).

Campus Avançado (@campusavancado):

Possuindo 23 anos de existência, o Campus Avançado também exerce a função de Pontão de Cultura na cidade de Niterói. De 2003 a 2008 celebrou um “Convênio de Cooperação Técnica e Assessoria” para expansão, captação de parcerias e divulgação dos Programas de extensão desenvolvidos pela PROEX, junto a Universidade Federal Fluminense (UFF), que tinha o objetivo de agilizar o acesso da sociedade aos saberes produzidos pela academia. De 2011 a 2015 foi o órgão responsável por documentar a semana da Bienal de Música Brasileira Contemporânea, promovida pelo Centro de Música da FUNARTE.

Grêmio Recreativo e Cultural Garra de Ouro (@garradeouro):

Fundada no ano de 2003, a sede da instituição fica localizada no bairro do Largo da Batalha, em Niterói. O seu símbolo é o punho da liberdade, as cores da agremiação são o vermelho e amarelo e as suas escolas madrinhas são a Unidos de Lucas e Unidos do Porto da Pedra. Tem os títulos de campeã do Grupo C em 2022, Grupo B em 2016 e de Blocos em 2009. Todas as conquistas são referentes ao carnaval niteroiense. Alguns sambas-enredos apresentados ao público no carnaval da cidade foram: Deixa Falar, Eu Sou a Escola de Samba (2016), Dourado, a cor do desejo (2012); Luiz Gama. O Espártaco negro, celebrando a liberdade na Conceição! (2019); No carnaval do Garra tem banda (2009) e Mulheres Negras do Cais. Resistência, pensamento e poesia, no mar do Garra de Ouro (2020).

Instituto GINGAS (@institutogingas):

Fundado no ano de 2003, o Instituto GINGAS é o único Ponto de Cultura da cidade de  Niterói que trabalha com a temática da acessibilidade cultural. O seu projeto social mais conhecido é o Din Down Down, que atende a comunidade PcD, mas especialmente pessoas com síndrome de Down. O projeto tem como método de ensino a cultura de matriz africana, mas especialmente a Capoeira, que é considerada Patrimônio Cultural e Imaterial da Humanidade. Em suas ações socioculturais, a instituição tem como foco a promoção e a difusão da inclusão e da acessibilidade cultural, dialogando diretamente com a cultura de matriz africana e a educação.

Associação para o desenvolvimento comunitário do Preventório – Maloca Cultural (@malocacult):

É um espaço de acolhimento e apoio à cena cultural do Morro do Preventório, localizado no bairro de Charitas em Niterói. O Ponto de Cultura é atuante na área da Capoeira, dança, Arte Urbana, Música e Produção Cultural. Em sua sede, o Maloca Cultural realiza eventos, oficinas e rodas temáticas de conversas.

Bloco Afro Cultural Olodumaré (@olodumare.oficial):

O Bloco Afro Cultural Olodumaré foi fundado por uma família tradicionalmente baiana no ano de 1985 e está localizado no Morro do Santo Cristo, bairro do Fonseca em Niterói. A instituição tem como objetivo a difusão da cultura afro-brasileira, luta contra a discriminação racial e o combate ao preconceito social e econômico. Atualmente, o bloco possui mais de 10 mil associados e oferta aulas de percussão aos sábados.

Grêmio Recreativo Cultural Escola de Samba Acadêmicos Data Vênia Doutor (@academicosdatavenia):

A escola de samba Acadêmicos do Data Vênia é um Ponto de Cultura criado no ano de 2016 por advogados, ela possui forte ligação com a OAB de Niterói e a sua escola madrinha é a União da Ilha do Governador. No ano passado, a escola foi reconhecida como Ponto de Cultura da cidade e neste ano ela está oferecendo o projeto Rítmo & Samba em parceria com a acção sociocultural “Brotaí”, que consiste em aulas de percussão aos sábados, de 9h às 12h no Fluminense Atlético Clube (Clube Fluminensinho).

Sociedade Fluminense de Fotografia – SFF (@sociedadefluminensefotografia):

Fundada em 1944 por Jayme Moreira de Luna em um porão de sua casa, a Sociedade Fluminense de Fotografia (SFF) é uma escola de fotografia e Ponto de Cultura da cidade de Niterói. Em outubro de 1949, o ex-governador Edmundo de Macedo Soares e Silva cedeu um terreno à agremiação para a construção de sua sede e, em 1956, a SFF inaugurou a sua escola fotográfica, que fica localizada na Rua Dr. Celestino 115, Centro de Niterói. A instituição oferta os cursos fundamentais de fotografia, composição fotográfica, edição de imagem, exposição de luz fotográfica e outros.

Por ausência de informações claras sobre os demais Pontos de Cultura não foi realizada a apresentação das instituições Centro de Estudos Afro-Brasileiro Ironides Rodrigues – CEABIR (@ceabir), Quilombo do Candongueiro (@candongueiro.oficial), Instituto Mestrissimo Zezeu Capoeira Estilo Livre (@institutozezeucapoeira) e Reciclarte (@reclicarte.educa). No entanto, insiro aqui o Instagram dessas ações culturais na cidade de Niterói.

Metodologia de projetos culturais e editais que serão lançados na cidade de Niterói neste ano:

Mestre Eduardo e seus alunos no projeto social Rítmo & Samba no Clube Fluminensinho. Foto: Israel Silva.

Os editais culturais possuem um predomínio da linguagem jurídica. Por ser uma escrita mais complexa, muitos fazedores culturais acabam desistindo de inscrever um projeto para determinado edital. Um termo muito utilizado é o “proponente” que remete diretamente à Pessoa Jurídica ou Física. No ano passado, o atual candidato à Prefeitura do Rio de Janeiro Tarcísio Motta realizou uma aula gratuita em seu Youtube detalhando os componentes que devem ter em um projeto cultural. Clique aqui para acessar a vídeoaula.

Em certos casos a busca por editais pode ser desgastante, a escassez de divulgação torna essa busca mais cansativa. Geralmente, os sites das secretarias de cultura – nos âmbito municipal, estadual e federal – divulgam editais com frequência. Outra saída é acompanhar outros sites e perfis em redes sociais que divulgam oportunidades de editais, a exemplo da plataforma Prosas e os perfis no Instagram Suburbana Produtora (@suburbana_produtora), Arte em Curso (@arteemcurso) e Naprocult (@naprocult_ufrj), sendo esse último tendo a administração do curso de Produção Cultural da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).

Relacionado aos editais culturais que a Prefeitura de Niterói está lançando ao longo do ano de 2024, os editais Cultura Geek e Circo e Teatro já não aceitam mais propostas. Atualmente, estão abertas inscrições para a Chamada Pública SMC 03/2024 – Seleção de Pontos de Cultura e Pontões de Cultura – Rede Cultura Viva. As inscrições começaram no dia 01 de agosto e serão aceitas propostas até às 18h do dia 16 de Setembro de 2024, para enviar uma proposta é por meio do site https://servicos.niteroi.rj.gov.br.
Além desses, ainda estão previstos para o segundo semestre o Edital de Cultura e Território, Edital de Ativos Culturais, Edital de Fomento, Edital Lei Aldir Blanc, Edital de Aquisição de Acervo para o Museu de Arte Contemporânea (MAC), Edital de Credenciamento de artistas e trabalhadoras/es da cultura e o Edital de Incentivo Fiscal – ISS/IPTU. Para ter mais informações sobre os editais, as datas e os seus respectivos valores acesse a página da Secretaria de Cultura de Niterói clicando aqui.

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